Descrição

A construção histórica da Psicossomática e sua efetivação como campo de conhecimento da Psicologia na área de Saúde.

PROPÓSITO

Compreender o conceito e a origem da Psicossomática para fins de obtenção de conhecimento e atuação profissional dentro da Psicologia, discutindo a dicotomia mente e corpo.

OBJETIVOS

Módulo 1

Comparar as abordagens monistas e dualistas no problema mente/corpo

Módulo 2

Descrever o conceito de Psicossomática e sua evolução histórica

Módulo 3

Relacionar fundamentos da Psicossomática às práticas atuais

Introdução

Vamos estudar a visão mente e corpo, o conceito de psicossomática e somatopsíquico, para assim descobrir a evolução da Psicossomática que aconteceu em três fases: psicanalítica, behaviorista e multidisciplinar. Precisamos compreender que a Psicossomática não se resume às doenças psicossomáticas, mas engloba todo um campo de estudos que considera o ser humano em sua forma biopsicossocial, ou seja, o ser humano em sua integralidade. Desta forma, vamos relacionar esses conceitos às práticas multi e interdisciplinares no campo da Saúde.

MÓDULO 1


Comparar as abordagens monistas e dualistas no problema mente/corpo

A dicotomia mente/corpo e sua repercussão na prática do profissional de Saúde

Para discutir as concepções monistas e dualistas sobre o problema da mente e do corpo, vamos precisar fazer uma breve visita à mãe de todas as ciências: a Filosofia. É na Filosofia que esse problema é posto de forma sistemática e pensado por renomados filósofos da nossa história. Veja os pensamentos de importantes filósofos sobre essas concepções.

Dualismo

Dualismo é uma oposição ao pensamento monista, ou seja, mente e corpo são entidades separadas, distintas e incompatíveis. Os dualistas, como o filósofo René Descartes, aceitam que há relação entre mente e corpo, mas isso não significa que a mente padeceria após a morte física do nosso corpo.

Vamos recorrer ao dicionário de Psicologia da American Psychological Association (APA) para melhor compreensão desse conceito:

No contexto do problema mente-corpo, dualismo é a posição de que mente e corpo constituem dois reinos ou substâncias separadas. Posições dualistas levantam a questão de como mente e corpo interagem no pensamento e no comportamento [...] Para Descartes, isso significa que a mente continua existindo mesmo que o corpo material não exista mais.

(APA, 2010, p.312)

Platão foi um dos mais brilhantes filósofos que existiu. Nasceu em Atenas, na Grécia Antiga, e viveu entre os anos de 427-347 a.C. Formulou a tese de que existe um mundo dos sentidos e um mundo das ideias. Para explicar melhor a tese de Platão, podemos usar uma ilustração confeccionada pelo próprio filósofo: o mito da caverna. De forma resumida, o mito da caverna consiste em prisioneiros que se encontram condenados a viverem o resto de seus dias em uma caverna, acorrentados e impossibilitados de enxergarem o que acontece por trás da entrada do lugar. Tudo o que eles conseguem ver são sombras de pessoas e objetos projetadas na parede da caverna, graças a uma fogueira presente no local. Um prisioneiro consegue escapar e encontrar a saída, observa admirado o mundo exterior que sempre esteve ali, mas com o qual ele apenas se conectava pelas sombras projetadas na caverna.

A alegoria da caverna serve para ilustrar a tese platônica do mundo das ideias e do mundo dos sentidos. Para o filósofo grego, este mundo seria justamente o material, que conseguimos captar pelos nossos órgãos sensoriais. São as projeções imperfeitas das sombras do que existe no mundo das ideias. Portanto, o mundo das ideias é o exterior da caverna no mito de Platão. É neste mundo que reside as formas perfeitas e eternas, separado do âmbito material e que não pode ser acessado pelos órgãos sensoriais. Em outras palavras, a forma de contato com o mundo das ideias é através da razão. É assim que Platão pode ser considerado um dualista: para ele, a alma do homem é imortal e um dia ela já habitou o mundo das ideias, pois, se o corpo é o possuidor dos sentidos e consegue captar esse mundo. A alma é possuidora da razão, e é a parte do ser humano que acessa o mundo das ideias.

Em Platão, existe uma clara separação entre corpo (material) e alma (abstrata). Enquanto o corpo habita o mundo dos sentidos, a alma pertence ao mundo das ideias. O corpo seria um instrumento para a alma do ser humano.

Outro importante dualista que também pertence ao campo da filosofia foi René Descartes. O filósofo francês pensava que os sentidos são ferramentas falhas para conhecer a verdade, pois eles nos enganariam o tempo todo. De fato, os sentidos humanos – visão, olfato, paladar, tato e audição – podem nos enganar. Basta recorrermos aos inúmeros exemplos de ilusão de ótica, nos quais uma figura pode ser interpretada de diversas formas, ou pode nos levar a acreditar que uma imagem estática está em movimento. Faça o seguinte exercício: entre no Google Imagens e digite a expressão “ilusão de movimento”. Você verá imagens estáticas, mas terá a sensação de que elas estão em movimento.

Descartes busca pôr em xeque todas as certezas sobre o mundo, com o objetivo de chegar a certezas irrefutáveis. A primeira certeza de Descartes era a de que ele não podia duvidar de sua própria existência, pois: penso, logo, existo. Em outras palavras, para pensar é preciso existir, não haveria a mínima possibilidade de um pensamento sem existência, logo, a existência se constituía em uma certeza para Descartes.

O filósofo usa o exemplo da cera para indicar como conhecemos as coisas pela razão e não pelos sentidos. Um pedaço de cera derretido tem suas características modificadas e transformadas, mas continua sendo cera:

O que é, pois, que se conhecia deste pedaço de cera com tanta distinção? Certamente não pode ser nada de tudo o que notei nela por intermédio dos sentidos, posto que todas as coisas que se apresentavam ao paladar, ao olfato, ou à visão, ou ao tato, ou à audição, encontram-se mudadas e, no entanto, a mesma cera permanece.

(DESCARTES, 1979, p. 96)

A dependência em conhecer através dos sentidos poderia nos enganar no exemplo citado, pois, graças a nossa res cogitans sabemos que a cera continua sendo cera, mesmo que derretida e com outras características.

Res cogitans

Termo de origem no latim, que significa coisa pensante. O ser humano tem uma res cogitans, em circunstâncias naturais, todo ser humano pensa e, como indicado por Descartes em seu método, pode duvidar das ideias que ele tem sobre si e sobre o mundo.

É neste sentido que o dualismo cartesiano está ancorado nessas duas substâncias incompatíveis. Enquanto a res cogitans está associada à mente, a res extensa está relacionada ao corpo. Aqui, existe um claro dualismo entre mente e corpo. Destaca-se a opção de Descartes em usar o substantivo res extensa para nomear a esfera da matéria física, o filósofo evidencia com essa escolha que toda matéria física tem uma extensão no espaço. A própria cera, ainda que derretida, continua ocupando o espaço com sua extensão. O próprio cérebro – órgão em que alguns autores da psicologia, principalmente, os de cunho cognitivistas, vão indicar como sinônimo de mente – possui uma extensão, mas, para Descartes, a mente não possui nenhuma extensão no espaço, o que, para ele, significa que ela continua existindo mesmo depois da morte do corpo material.

De que forma mente e corpo se relacionavam em Descartes? O autor acreditava que a glândula pineal exerce um papel fundamental nesse processo. Segundo o pensador:

Res extensa

A gênese da palavra está no latim e significa coisa expandida. Descartes usa o termo para indicar o aspecto físico da matéria. Toda a matéria ocupa espaço físico, ainda que ela seja modificada como a cera derretida, a propriedade da extensão continua existindo na mesma matéria.

A razão que me persuade de que a alma não pode ter, em todo corpo, nenhum outro lugar, exceto essa glândula, onde exerce imediatamente suas funções, é que considero que as outras partes de nosso cérebro são todas duplas, assim como temos dois olhos, duas mãos, duas orelhas, e enfim todos os órgãos de nossos sentidos externos são duplos [...]

(DESCARTES, 1979, p. 229)

A mente não é sinônimo de cérebro para Descartes, porque os animais, assim como os humanos, possuem cérebros, mas eles não possuem capacidade de raciocínio. Os animais, em suma, consistem apenas em corpos, já os seres humanos possuem corpos e mente.

Descartes se aproxima de Platão, não no sentido da existência de um mundo dos sentidos e um mundo das formas, mas pela via da existência da mente (ou alma em Platão), após o perecimento do corpo físico humano.

Monismo

A posição dualista do problema mente e corpo não é uma unanimidade nos dias de hoje. Grande parte da comunidade científica defende uma posição monista, isto é, de que mente e corpo não se constituem em substâncias diferentes. Se, para Platão, havia um mundo dos sentidos e um mundo das ideias, o primeiro abrigando a substância material enquanto o segundo acolhia nossas almas, para os monistas, essa separação não existe. Os monistas acreditam que o ser humano, apesar da sua aparente diversidade expressa pelo problema mente e corpo, tem sua gênese em um único princípio ou substância.

Monismo – Em uma concepção discursiva do problema mente e corpo, os monistas são aqueles que pensam em uma integração entre as duas entidades, ou seja, mente e corpo estão relacionados e intrinsecamente combinados. O dicionário de psicologia da APA descreve: “No contexto do problema mente-corpo, monismo é qualquer posição que evita o dualismo.” (APA, 2010, p.621)

Aqui, é importante destacar que existe uma ideia geral de que a vertente dualista do problema mente e corpo se relaciona de uma forma mais próxima a algum tipo de espiritualidade – o que faz sentido, uma vez que a eternidade da mente em Descartes, ou o mundo das ideias de Platão, evoca um mistério desconhecido pelo ser humano. Enquanto o monismo estaria mais associado a uma crença na finitude da espécie, de seu corpo, de sua mente e de sua substância. Porém, alguns filósofos monistas também pensavam o monismo pela via do espírito. Para Hegel, por exemplo, não existe separação entre ser e pensar (como existe em Descartes), ou seja, ele é um monista. Entretanto, Hegel pensa um monismo pela via de espírito infinito. Algo parecido acontece em Spinoza que, apesar de ser monista, considera que Deus é a substância única, mas no sentido de que Deus e natureza são a mesma coisa, por isso, Spinoza é considerado um panteísta.

A nossa Psicologia contemporânea do século XXI tende a se aproximar mais do monismo do que do dualismo. Uma das explicações para essa posição foi a empreitada de tornar a Psicologia do século XIX uma ciência experimental. É William Wundt quem leva esse crédito ao inaugurar, em 1879, na cidade Leipzig (Alemanha), o primeiro laboratório de Psicologia Experimental oficial do mundo.

Portanto, para se tornar ciência, a Psicologia precisou se adequar aos equipamentos, instrumentos e laboratórios, considerados científicos. Como analisar a mente através de instrumentos e técnicas científicas, uma substância que, para Descartes, não tem extensão no tempo e que, para Platão, já habitou o mundo das ideias? Na impossibilidade de provar a existência da mente separada do corpo, pelo menos no que tange ao uso de instrumentos científicos, grande parte dos psicólogos atualmente adota uma posição monista, o que não significa dizer que o dualismo tenha desaparecido da Psicologia ou de qualquer outro campo científico. No entanto, é bem verdade que é mais difícil encontrar cientistas que adotam essa posição, pelo menos, publicamente.

O curioso caso de Phineas Gage

O emblemático caso de Phineas Gage é usado para ilustrar o monismo e sua afirmação de que mente e corpo constituem uma só substância. Phineas Gage foi um estadunidense nascido em 1823, no estado de Nova Hampshire. Em 1848, Gage estava trabalhando como operário em uma linha férrea. Seu trabalho era fazer detonações no terreno para construir o caminho necessário para a passagem dos trilhos. Essa detonação era feita com pólvora e, em uma de suas rotinas, um acidente aconteceu, enquanto Gage estava acomodando a substância no local em que havia planejado.

O acidente fez voar uma barra de ferro de mais de 1 metro contra seu crânio. A barra atravessou seu rosto atingindo seu cérebro, atravessando a extremidade da cabeça do operário. A morte parecia certa para os seus colegas de trabalho, que vislumbraram o acidente, mas Gage ficou apenas atordoado e logo recuperou seus sentidos. Suas capacidades intelectuais pareciam intactas e é provável que os médicos da época tenham ficado surpreendidos pela aparente falta de consequências ou efeitos colaterais do acidente. Contudo, após o acidente, Phineas Gage, que era considerado um exemplo de trabalhador, responsável, respeitoso e educado com as pessoas que conheciam seu caráter, passou a agir de forma bem diferente, tratando as pessoas com desdém, de forma desrespeitosa, agindo com irresponsabilidade e sendo grosseiro com seus colegas de trabalho.

Será que a barra de ferro que atravessou seu cérebro lesionando-o tinha alguma relação com essa mudança na personalidade de Phineas Gage? “150 anos mais tarde, pesquisadores usando técnicas modernas de neuroimagem do crânio preservado de Gage e uma simulação computadorizada do acidente, demonstraram que o principal dano ao cérebro de Gage tinha ocorrido no córtex pré-frontal [...] esta área do cérebro é envolvida na maioria dos nossos processos de pensamento avançado [...] Por isso, não é surpresa que os aspectos do self – as características que associamos ao nosso self, as emoções provocadas por essas características e nossa habilidade em regulá-lo, envolvam o processamento no córtex pré-frontal.” (NOLEN et al., 2012, p. 458)

A mente é composta pelas propriedades que apenas um ser humano é capaz de expressar, pelo menos até o estado da arte científica atual, como pensamento crítico, raciocínio lógico, linguagem, aspectos relativos à personalidade de cada ser, sentimentos, emoções, memórias, entre outras. Alguns desses aspectos mentais foram prejudicados por causa da barra de ferro que atravessou Phineas Gage. Isto seria um indício de que mente e corpo (cérebro) formam uma única substância. O exemplo do operário norte-americano pode ser utilizado como uma forma de ilustrar a posição monista no que tange ao problema mente e corpo.

Atualmente, a Psicossomática parece estar mais próxima de uma abordagem monista do que de uma visão dualista do problema mente e corpo. O próprio Hipócrates, filósofo que pensa em uma medicina psicossomática mesmo sem dar este nome, era um filósofo monista. Ele considerava que a alma (o que chamaríamos de mente nos dias de hoje) era um componente orgânico do corpo.

A posição da Psicossomática faz sentido na medida em que os profissionais e estudiosos do campo pensam que os aspectos psicológicos podem fazer surgir uma determinada doença ou até mesmo trazer complicações para uma doença já existente. É a mente trazendo reflexos para o corpo. A abordagem somatopsíquica também vai fazer essa relação pela via inversa, como vamos ver posteriormente: o corpo físico e material gerando impactos psicológicos nesse sujeito. É compreensível que essa relação mente-corpo e corpo-mente na Psicossomática se enverede pelas vias do monismo, que concebe mente e corpo como uma única substância, pois, na medida em que um desses aspectos do ser humano é modificado, o outro acaba absorvendo consequência dessa mudança, sejam elas positivas ou negativas.

É claro que o dualismo também considera que há relação entre mente e corpo, basta recordarmos a glândula pineal como o local da alma humana para Descartes. Entretanto, essa relação parece ser mais frágil na medida em que a mente continuaria a existir após a morte do corpo físico para os dualistas. No monismo, mente e corpo padecem uma vez que o sujeito deixa de existir, pelo menos no que tange ao mundo físico. É por isso que a posição atual da Psicossomática está mais próxima de um monismo do que de um dualismo.

Compreender a relação, associação e imbricação entre mente e corpo é fundamental para o profissional que aposta na Psicossomática como ponto privilegiado para tratar o ser humano enquanto um ser integral. Estar atento aos aspectos biológicos, psíquicos e sociais do indivíduo pode auxiliar no processo de cura do sujeito.

Visões sobre a relação mente & corpo

Imagine um profissional que pense apenas na materialidade do corpo do sujeito e leve em consideração apenas as lesões físicas ou doenças que se apoderam da estrutura física do indivíduo. Até um cardiologista que vai decidir se opera ou não opera um determinado paciente, ou se o caso dele é de urgência, ou se pode esperar mais um pouco. Para tomar essas decisões, ele precisa ter esse olhar para os aspectos emocionais do cardíaco. Seria interessante que todo médico que fosse tomar essa decisão, perguntasse como vai a vida dessa pessoa, de seus familiares, os aspectos financeiros; de forma geral, verificasse a regularidade da vida desse sujeito a fim de descobrir se está propenso a tomar algum grande susto em sua vida que descompense suas emoções e que possa agravar seu quadro cardíaco, levando-o até um infarto.

Agora, pense em outro profissional que considera apenas o psicológico do sujeito. Neste exemplo, focaremos em um profissional de Psicologia, que é aquele que está trabalhando com a subjetividade, emoção, sentimentos e cognições do sujeito de forma mais direta e clara. Este psicólogo clínico que estamos imaginando recebe em seu consultório um paciente, preocupa-se apenas com o psicológico dessa pessoa. Conforme as sessões avançam no tempo, as queixas de insônia, cansaço, tristeza e ganho de peso vão se acumulando e ganhando cada vez mais força na vida dessa pessoa. O psicólogo não tem dúvida e diagnostica o paciente com depressão. Todavia, o psicólogo insiste na hipótese de que a depressão deste sujeito está relacionada a uma série de pensamentos disfuncionais, crenças e esquemas, que favorecem o surgimento deste transtorno. Ainda que a terapia esteja ajudando essa pessoa, a depressão continua persistindo.

Em um exame de rotina indicado por seu médico, esse sujeito descobre que possui hipotireoidismo e que esta desregulação da tireoide pode acarretar sintomas bem semelhantes a um quadro depressivo e, inclusive, algumas pessoas com hipotireoidismo podem desenvolver um quadro depressivo de fato. Com o tratamento adequado indicado pelo médico e com o acompanhamento psicológico, essa pessoa consegue melhorar seu quadro depressivo. O psicólogo observou apenas a mente do sujeito e desconsiderou seu corpo. Caso tivesse uma visão mais holística do problema, poderia ter poupado seu paciente de um longo período de sofrimento, fazendo a indicação para o médico competente e descobrindo o problema hormonal precocemente.

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MÓDULO 2


Descrever o conceito de Psicossomática e sua evolução histórica

A HISTERIA E A PSICANÁLISE

Durante o século XIX e início do século XX, alguns proeminentes médicos, como Jean-Martin Charcot, Pierre Janet, Josef Breuer e Sigmund Freud, investigavam com afinco e interesse um fenômeno que causava curiosidade em uma parcela da comunidade médica europeia. Tratava-se de casos que chegavam a vários consultórios médicos da época. Eram casos de pessoas, mais especificamente mulheres, que apresentavam sintomas de problemas físicos ou uma desordem com o próprio corpo. Os sintomas eram os mais variados e podiam incluir cegueira, dores nas pernas, desmaios, impossibilidade de andar, câimbras nos membros superiores ou inferiores, amnésia e uma série de outros sintomas. Apesar da grande gama de sintomas que podiam se manifestar das mais diversas formas, algo em comum agrupava esse conjunto de pessoas que buscavam tratamento com os médicos da época: elas experimentavam os sintomas, mas os exames médicos não apontavam uma causa física ou lesão orgânica nesses sujeitos.

Vamos imaginar uma mulher que chega a um consultório médico reclamando que, de forma repentina, ficou cega. Ela conta que foi se divertir em uma festa com amigos e amigas na noite anterior, bebeu um pouco mais além da conta, mas que chegou em casa em segurança levada por uma das pessoas que estavam no seu grupo. Chegando em casa, procurou a cama de imediato, pois estava muito cansada e com dores de cabeça devido à alta dose de álcool que ingeriu na noite. O médico, muito preocupado, pede com gentileza que essa senhora se sente sobre sua maca para que ele possa examiná-la. Várias hipóteses começam a circular nos pensamentos do médico. Cuidadosamente, o médico vai até sua mesa e abre uma gaveta, retira uma pequena lanterna e se dirige até a maca. O médico acende a lanterna e joga a luz do objeto nos olhos da mulher. Para sua surpresa os olhos da paciente estão reagindo à luz, isso significa que não existe nenhum tipo de lesão física que justifique a cegueira. Ela deveria estar enxergando, mas ela afirma que não está. Esse tipo de manifestação, transtorno ou doença ficou conhecido como histeria.

Histeria - A histeria é uma palavra de origem grega (hystera) que significa útero. A origem do termo nos indica o motivo dessa desordem ter sido nomeada de tal forma, pois as observações dos médicos, psicanalistas e neurologistas dos séculos XIX e XX apontavam para uma predominância da histeria nas mulheres.

[...] uma neurose caracterizada por quadros clínicos variados. Sua originalidade reside no fato de que os conflitos psíquicos inconscientes se exprimem de maneira teatral e sob a forma de simbolizações, através de sintomas corporais paroxísticos (ataques ou convulsões de aparência epiléptica) ou duradouros (paralisias, contraturas, cegueira).

(ROUDINESCO, 1998, p. 337)

Não era incomum encontrar médicos que se recusavam a tratar as histéricas, pois acreditavam que seus sintomas eram uma espécie de atuação teatral e que elas não estavam doentes de verdade. A falta de uma comprovação concreta expressa em algum tipo de exame e a ausência de lesões orgânicas que justificassem as queixas das pacientes contribuía para a recusa. Outros médicos acreditavam nas histéricas, mas se sentiam limitados no que tange a formas de ajudar essas pessoas, uma vez que não havia exames que comprovassem lesões. E se não há lesão orgânica comprovada, como ele poderia oferecer algum tipo de ajuda ou tratamento para suas pacientes? Até mesmo as explicações que Freud forneceu para a manifestação da histeria não foram suficientes por um longo período. A aceitação de suas teorias sobre as histéricas começou a ganhar mais prestígio à medida que sua respeitabilidade, enquanto fundador da Psicanálise, foi crescendo. Essa pequena explicação sobre a histeria nos ajuda a compreender como as doenças foram tratadas de forma isolada pelos profissionais que se incumbiam delas. Somente as manifestações físicas e as lesões orgânicas nos tecidos do corpo humano eram consideradas na hora de ajudar alguém que estava sofrendo.

Hoje, evoluímos nesse sentido e muitos profissionais compreendem a importância de um diagnóstico e tratamento mais integrado. Médicos encaminham seus pacientes para consultórios de psicologia, educadores solicitam aos familiares da criança uma avaliação junto a um neurologista, psicólogos encaminham seus pacientes ao psiquiatra. Há uma preocupação desses profissionais em saber em que contexto essa queixa é produzida. Inclusive, é cada vez mais comum e desejável que os profissionais – para além de fazerem esses encaminhamentos – busquem contato direto um com o outro, no intuito de discutir o caso do paciente que ambos têm em comum. Isso porque, assim podem traçar estratégias conjuntas mais efetivas com o objetivo de ajudar de forma mais eficaz a pessoa que os busca. O ser humano é um ser biopsicossocial e, por isso, deve ser tratado nesta perspectiva.

Afirmar que o ser humano é um ser biopsicossocial significa dizer que esses três aspectos de sua vida devem ser considerados quando se fala de um ser humano. Todos os seres humanos possuem uma herança genética, características físicas próprias e um corpo biológico composto de órgãos, hormônios, neurônios, tecidos fibrosos, ossos, músculos e afins. Porém, o corpo não se resume apenas a essas características biológicas, também existem nossas variáveis psíquicas: atenção, inteligência, emoções, personalidade, humor etc. Tão importante quanto nossas características biológicas e psíquicas é o contexto social em que vivemos, nossas relações familiares, escolares, religiosas, políticas, laborais e afetivas também formam um ser humano. Essas três dimensões são indissociáveis e, por isso, as escrevemos juntas: biopsicossocial.

Ainda que muitos profissionais, sejam eles médicos, psicólogos, psicanalistas, neurologistas, educadores, dentre outros, compreendam o ser humano enquanto um ser biopsicossocial, muitas doenças parecem sofrer dessa mesma característica que a histeria sofria: parecem ser “frescura”, algo menos importante ou até mesmo falta de vontade do sujeito em superar o que está passando. Um bom exemplo é a depressão. Frases como: “isso é falta do que fazer” ou “dê um tanque de roupa suja para lavar que ele vai melhorar rapidinho” ou ainda que a depressão seria “falta de Deus na vida do sujeito”, costumam ser ouvidas por pessoas que passam por um processo depressivo e não contribuem em nada para a melhora, pelo contrário, essas frases preconceituosas podem agravar o quadro desses indivíduos.

Parece que a falta de um exame de imagem ou uma lesão orgânica também faz uma parcela da sociedade não dar a importância devida a transtornos psicológicos ou doenças que não possuem uma explicação física. É possível que essas pessoas até neguem a existência desses transtornos, uma vez que eles não saem em uma ressonância magnética. Esse é o caso das doenças psicossomáticas que vamos estudar com mais profundidade a partir de agora.

O CONCEITO DE PSICOSSOMÁTICA

PSICOSSOMÁTICA: conceitos e história

Psicossomática é uma palavra formada pela junção de duas outras de origem grega:

psique = alma e soma = corpo

A Psicossomática estuda como a nossa mente se relaciona com o nosso corpo e a produção de doenças. Segundo Julio de Melo Filho (2010), uma pesquisa em Psicossomática se debruça: “[...] sobre a relação mente-corpo, sobre os mecanismos de produção de enfermidades, notadamente sobre os fenômenos do estresse” (FILHO et al., 2010, p. 29).


A definição do termo para a APA (2010, p.765) é a seguinte: “adj. caracteriza abordagem baseada na crença de que a mente (psique) desempenha um papel em todas as doenças que afetem os vários sistemas corporais (soma).”


Roudinesco localiza na Grécia Antiga o nascimento deste tipo de Medicina: “Nascida com Hipócrates, a Medicina Psicossomática concerne simultaneamente ao corpo e ao espírito e, mais especificamente, à relação direta entre a soma e a psyché. Descreve a maneira como as doenças orgânicas são provocadas por conflitos psíquicos, em geral inconscientes” (ROUDINESCO, 1998, p. 624). É importante destacar que tanto a palavra alma como o termo espírito possuem um sentido de mente nesses escritos.

Vamos recorrer aos exemplos para esclarecer os conceitos de psicossomática e somatopsíquica.

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ESTUDO DE CASO 1

Imagine um atleta que está se preparando há quatro anos para as Olimpíadas que acontecerão em seu país. Esse atleta está confiante com as chances de ganhar uma medalha olímpica e seus treinadores acreditam que o Brasil tem boas chances de conseguir o pódio nos 100 metros rasos com sua boa performance. Alguns meses antes das Olimpíadas, o atleta sofre um acidente e fratura uma das pernas necessitando de cirurgia e um longo período de reabilitação.

As Olimpíadas chegam e ele assiste de casa o pódio ser ocupado por dois quenianos e um canadense. Por ser muito patriota, a derrota do país na modalidade é sentida como um fracasso pessoal; ele pensa que talvez pudesse alegrar seu povo com uma medalha, caso não estivesse impedido de competir. Depois de alguns meses, o atleta começa a apresentar sintomas depressivos como uma tristeza profunda que se estende por mais de duas semanas, incapacidade de experimentar prazer nas coisas que antes lhe traziam satisfação, insônia e pensamentos de morte. O acompanhamento psicológico e psiquiátrico indica um transtorno depressivo. O leitor consegue perceber como a lesão e seus efeitos está acompanhada de enormes impactos psicológicos na vida deste atleta? É exatamente isso que a somatopsíquica vai investigar.

ESTUDO DE CASO 2

Agora, vamos imaginar que tudo o que o atleta brasileiro dos 100 metros rasos vivenciou não passou de um terrível pesadelo. Ele acorda e verifica que sua perna está intacta. Os treinos continuam trabalhando intensamente e as esperanças de subir ao pódio estão mais próximas do que nunca. Alguns meses antes de começar as Olimpíadas, o atleta começa a sentir desconfortos abdominais, cólicas e uma estranha alternância entre períodos de prisão de ventre seguidos por outros períodos de diarreia. O nosso corredor posterga a ida ao médico e pensa que os sintomas logo irão passar. Após mais algumas semanas de sofrimento e de prejuízos ao seu treinamento, o atleta resolve buscar ajuda especializada. Uma colonoscopia é realizada para verificar a saúde do seu intestino e nada é constatado. O exame clínico do médico é fundamental para o diagnóstico e o profissional chega à conclusão de que a nossa esperança de medalha sofre da síndrome do intestino irritável. O médico levanta a hipótese da sua condição ter sido gerada pela ansiedade com a chegada da competição. Este seria um caso que interessaria a Psicossomática, pois um fator psíquico influenciou a chegada de uma síndrome no intestino.

Vale notar que condições psicossomáticas e somatopsíquicas podem acontecer de forma conjunta, uma não anula a outra, necessariamente. É possível que uma pessoa conviva com alguma condição crônica de saúde que movimente negativamente seu psiquismo que, por seu turno, vai trazer consequências desfavoráveis para o físico desse sujeito. Por exemplo: a fibromialgia é uma doença psicossomática na medida em que o psiquismo do sujeito tem influência na dor e na intensidade da doença. Mas também é somatopsíquica, uma vez que o sofrimento experimentado pode gerar um quadro de ansiedade generalizada na pessoa, que sempre está à espera da próxima onda de sofrimento. Ou seja, não há dualidade mente e corpo, como já dito anteriormente. Nesta perspectiva, a dualidade mente-corpo é superada.

Somatopsíquicas

A APA ainda nos oferece uma boa definição de Somatopsicologia (que pode ser compreendida como um sinônimo de somatopsíquico): “s. o estudo do impacto psicológico de doença ou incapacidade fisiológica [...]” (APA, 2010, p. 875).

AS TRÊS FASES DA PSICOSSOMÁTICA

A Psicossomática surge como uma reação à tradição dualista cartesiana de estudar a doença. Propõe um olhar holístico para a doença e se refere à origem psicológica de doença orgânica e aos efeitos psicológicos de doença física (somatopsíquica), compreendendo mente, corpo e ambiente como indissociáveis para compreensão da saúde e do adoecimento humanos.

Como já aprendemos, o termo aparece pela primeira vez em 1818, quando o psiquiatra alemão J.C. Heinroth descreve a insônia e a influência das paixões na tuberculose, na epilepsia e no cancro, mas, somente no século posterior, o conceito é estruturado por influência da Psicanálise.

Em uma perspectiva histórica, podemos afirmar que a Psicossomática passou por três fases (FILHO & BURD, 2010). São elas: a fase psicanalítica, a behaviorista e a multidisciplinar. Examinemos com um pouco mais de detalhes cada uma dessas fases.

Fase psicanalítica

É a primeira fase descrita pelos autores do livro que usamos como referência no Brasil, quando o assunto é Psicossomática. Freud, o pai da Psicanálise, entendia que ideias reprimidas podiam acarretar conversões sintomáticas no corpo do sujeito. É o que já vimos anteriormente com a histeria e sua conversão em um sintoma físico, sem um correspondente orgânico lesionado:

“A conversão foi descrita por Freud como um mecanismo inconsciente, presente na matriz clínica da neurose histérica, em que a pulsão ligada a uma ideia é recalcada, é convertida em representantes ideativos do próprio corpo”.

(GALDI & CAMPOS, 2017, p. 30)

Nesse sentido, para a Psicanálise, algumas enfermidades que não podiam ser explicadas por lesões físicas, que, por consequência, eram consideradas psicossomáticas, tinham suas origens no inconsciente.

Para enfatizar a diferença entre a histeria e uma doença psicossomática, é importante destacar que, na histeria, não existe um correspondente físico lesionado para os sintomas do sujeito e, na Psicossomática, também pode não existir essa relação. Contudo, diferentemente da histeria, que nunca apresenta um órgão, tecido ou músculo que apresente distúrbios, na Psicossomática, é possível que isto ocorra devido às questões da psique.

Fase behaviorista

A segunda fase diz respeito à behaviorista da Psicossomática. Os behavioristas formavam grupos que nos séculos XIX e XX queriam fazer da Psicologia uma ciência mais objetiva e quantificável. O interesse dos behavioristas era prever e controlar o comportamento (WATSON, 1913, p. 1). O Positivismo, corrente filosófica que defendia a neutralidade, objetividade e sistematização das pesquisas, exerceu grande influência nas obras behavioristas. É de se imaginar que esses preceitos foram usados nos estudos behavioristas sobre as doenças psicossomáticas, diferente de grande parte da comunidade que as estuda, que compreende a existência da mente e seus efeitos sobre o corpo.

Os behavioristas, ainda que admitam a existência da mente, não estão interessados em seu estudo, uma vez que, para esses teóricos, o que importa é o comportamento e o ambiente em que o sujeito está inserido.

Para eles, a mente é uma substância abstrata que não pode ser medida, quantificada e observada de forma direta, neutra e empírica. Alguns behavioristas chegam a afirmar que a psicossomática está mais para a vertente dualista do que para uma concepção monista.

Os behavioristas se afastam dos estudos que buscam investigar a mente e seus processos, pois são eventos que não podem ser observados. Essa é a posição de Watson, que concebia a existência da mente, mas pensava ser impossível estudá-la com os métodos que considerava adequado para uma psicologia que pretendia se tornar científica. Para estudar os processos mentais, era comum que os contemporâneos de Watson utilizassem uma metodologia conhecida como introspecção.

Se, para os behavioristas, a mente não deve ser estudada, já que está inacessível aos nossos métodos de pesquisa realmente válidos, como eles entendem a Psicossomática? Para os behavioristas, essas alterações fisiológicas sem causa orgânica aparente podem ser compreendidas olhando para as contingências.

Uma série de contingências aversivas são experimentadas pelas pessoas em suas rotinas. O ambiente de trabalho e as tarefas laborais podem, por exemplo, resultar em níveis elevados de estresse incessante. Para os behavioristas, o ambiente do sujeito que somatiza precisa ser transformado em algo mais positivo para sua saúde, principalmente, se esse sujeito não tem condições de contornar as contingências aversivas de sua vida por conta própria.

Contingência

Pode ser entendida como a probabilidade de um determinado evento (o estresse, por exemplo) acontecer depois de um outro evento (uma bronca do chefe no trabalho, por exemplo). Assim, o estresse é contingente à bronca do chefe no trabalho. Segundo a definição da APA: “s. relação condicional, probabilística, entre dois eventos.” (APA, 2010, p. 225).

Fase multidisciplinar

É a terceira fase da Psicossomática. Filho et al. (2010, p. 29) afirmam que a terceira fase é: “[...] atividade essencialmente de interação, de interconexão entre vários profissionais de saúde.” Uma abordagem multidisciplinar pressupõe a contribuição de diversos profissionais para atender um mesmo paciente. Pensar a Psicossomática desta forma implica na aposta de que o psicólogo, o médico, o psiquiatra, o nutricionista, o neurologista ou qualquer outra especialidade, não consegue dar conta da integralidade do sujeito de forma isolada. A multidisciplinaridade está relacionada ao conceito de um ser humano biopsicossocial. França e Rodrigues (2005) resumem bem essa afirmação, para eles: “[...] o que somos hoje é resultado de nossa interação com o mundo e todas as nossas experiências do passado e de expectativas futuras. É um sistema único, constituído por três subsistemas: mente, corpo e relacionamentos sociais”.

Cabe ressaltar que uma instituição de cuidados clínicos composta por diversos profissionais de saúde, como médicos, enfermeiros, nutricionistas, psicólogos, assistentes sociais, dentre outros, não está automaticamente praticando uma medicina psicossomática. Ainda que a atual fase da Psicossomática demande uma multidisciplinaridade, é necessário que esses profissionais compreendam o ser humano enquanto um ser biopsicossocial e o tratem dessa forma, considerando a possibilidade de que a psique possa influir em desordens físicas e que estas possam descompensar a psique do sujeito. Uma atuação psicossomática não pode tratar apenas da doença. Filho et al. (2010, p. 40) dizem que essa nova visão terapêutica “[...] trouxe para o pensamento médico-científico e para a prática assistencial o mote clássico: tratar doentes e não doenças.”

A Psicossomática não resume apenas as doenças psicossomáticas. Engloba uma compreensão de ser humano biopsicossocial e a importância de um trabalho multidisciplinar para oferecer a melhor assistência possível para as pessoas que necessitam de cuidados em saúde.

É nesse sentido que Filho et al. (2010, p. 29) afirmam que:

Psicossomática, em síntese, é uma ideologia sobre a saúde, o adoecer e sobre as práticas de Saúde, é um campo de pesquisas sobre estes fatos e, ao mesmo tempo, uma prática – a prática de uma Medicina integral [...] Hoje, a gama de atividades do que se chama de Psicossomática abrange o ensino ou a prática de qualquer tipo de fenômenos de saúde e de interações entre pessoas, como as relações profissionais-pacientes, as relações humanas dentro de uma família ou de uma instituição de saúde, a questão das doenças agudas e crônicas, o papel das reações adaptativas ao adoecer, a invalidez, a morte, os recursos terapêuticos extraordinários.

(FILHO et al., 2010, p. 29)

O DSM E A PSICOSSOMÁTICA

As doenças chamadas psicossomáticas, por serem desencadeadas ou agravadas por questões psicológicas, podem ser manifestadas em dores, alterações gastrointestinais, tremores, manchas na pele, falta de ar e esses sintomas tendem a se intensificar em situações de estresse. O diagnóstico é complexo e se dá por exclusão. Não há uma causa específica, mas alguns fatores são recorrentes, como a sobrecarga profissional, vivência de evento traumático, situações de violência, luto, ansiedade, preocupação excessiva, entre outras situações possíveis de desencadear estresse. A dificuldade em falar sobre o sofrimento psicológico vivenciado parece ser um fator relevante nesses casos.

Nosso organismo, quando sobrecarregado, possui três vias de descarga das excitações: o pensamento, o comportamento e o organismo. Assim, o sofrimento intenso ou mesmo a sobrecarga de atividades pode perturbar o funcionamento do organismo e favorecer, de acordo com a cultura, os traços de personalidade e o momento de vida, o surgimento de patologias psíquicas ou somáticas. Isso acontece quando o conflito psíquico e o sofrimento ultrapassam a capacidade habitual da pessoa de tolerar situações de estresse, impedindo que estas sejam elaboradas. O adoecimento aparece como uma tentativa de equilíbrio para o corpo e, quando é percebido dessa forma, implica não somente em tratar os sintomas da doença, mas também mudar os fatores que propiciaram seu desencadeamento.

Essas patologias são tratadas no capítulo de Sintomas Somáticos e outros Transtornos Relacionados, na última revisão do Manual de Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-V).

Manual de Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-V)

O Manual de Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais 5.ª edição ou DSM-5 é uma referência para psicólogos, médicos e terapeutas ocupacionais, elaborado pela Associação Americana de Psiquiatria para definir diretrizes no diagnóstico de transtornos mentais. O instrumento é atualizado de acordo com o avanço científico que fornece novas evidências que podem retirar, inserir ou alterar critérios para diagnóstico.

O DSM-V classifica como portador de Transtorno com Sintomas Somáticos os indivíduos que apresentam qualquer número de sintomas somáticos acompanhados por pensamentos, sentimentos ou comportamentos excessivos, relacionados aos sintomas em si ou preocupações associadas com a saúde, caracterizado por:

Pensamentos desproporcionais e persistentes sobre a gravidade dos próprios sintomas

Nível persistentemente elevado de ansiedade sobre a saúde ou sintomas

Excesso de tempo e energia dedicados a estes sintomas ou problemas de saúde

Atenção

O diagnóstico pode ser aplicado mesmo na presença de uma doença clínica devido à ênfase dada aos pensamentos e comportamentos que acompanham o sintoma.

O diagnóstico de Transtorno de Ansiedade de Doença é recebido por indivíduos que experimentam um alto nível de ansiedade, com temor de estar doente, mas sem sintomas somáticos. Estes indivíduos eram classificados como hipocondríacos até o DSM-IV e esta categoria foi excluída devido ao caráter pejorativo que o termo adquiriu como “quem tem mania de doença”.

O Transtorno Factício foi incluído no capítulo dos Sintomas Somáticos e Outros Transtornos Relacionados com um diagnóstico para indivíduos que apresentam falsificação de sintomas físicos ou psicológicos, sem um incentivo externo evidente, motivado por assumir o papel de enfermo. Nesses casos, não falamos em adoecimento psicossomático. São situações em que os sintomas não existentes são usados como justificativa para determinado comportamento ou mesmo para obter benefícios, sejam eles conscientes ou inconscientes.

Outro quadro estudado anteriormente, quando contextualizamos o que ficou conhecido como Histeria de Conversão pela Psicanálise, é o que hoje está classificado como Transtorno Conversivo. Nesse quadro, é necessária a presença de um ou mais sintomas de alterações da função motora e sensorial voluntária, tendo os exames neurológicos descartando outras causas para a sintomatologia apresentada. Nesses casos, o sintoma não é falseado como no Transtorno Factício, nem o organismo apresenta algum tipo de lesão orgânica de fato como no Transtorno de Sintomas Somáticos. A pessoa de fato sente o que está relatando, mas não há alteração no organismo que justifique o que está relatando sentir.

Há ainda a inclusão de um novo diagnóstico neste capítulo, Fatores Psicológicos que Afetam Outras Condições Médicas, que identifica os quadros nos quais fatores psicológicos e comportamentais afetam negativamente o estado de saúde, por interferirem em outras condições clínicas.

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MÓDULO 3


Relacionar fundamentos da Psicossomática às práticas atuais

O humano como sujeito psicossomático: uma visão holística da saúde e suas implicações práticas

A PSICOLOGIA DA SAÚDE

Doenças já foram tratadas como algo isolado, levando em conta, pura e simplesmente, suas questões relacionadas a manifestações físicas. Introduzido por Heinroth, no início do século XIX, o termo psicossomático vai nos dizer sobre a influência recíproca entre mente e corpo, buscando compreender toda perturbação somática resultante de uma desordem psicológica, que intervém de modo constante na gênese da doença.

O conceito de psicossomática engloba três diferentes horizontes. O primeiro diz respeito à dimensão psicológica da doença, toda doença física tem implicações psíquicas para o sujeito que a experimenta. O segundo horizonte vai enfatizar a importância da relação entre médico e paciente, já que uma boa relação pode contribuir para a recuperação do sujeito e até mesmo para a adesão do paciente a uma determinada intervenção. O terceiro horizonte destaca os procedimentos terapêuticos em relação à pessoa que, no momento, está doente. Tais procedimentos, sejam eles realizados por qualquer profissional que esteja envolvido no caso, precisam levar em conta que o ser humano é um ser biopsicossocial.

A Psicologia da Saúde tem início, pelo menos no que tange a seu marco oficial, com um grupo de trabalho na APA. Esse grupo se reúne para discutir a crescente demanda pela prática da psicologia da saúde e para conduzir e avaliar pesquisas neste campo. Oito anos depois do início das atividades deste grupo, uma divisão específica para a área foi criada dentro da instituição que congrega inúmeros psicólogos norte-americanos. Essa divisão ficou conhecida como divisão 38.

Aqui em nossas terras tropicais, as instituições de saúde surgem como mais um dos inúmeros campos de atuação para os profissionais que se graduaram em Psicologia. Os hospitais e demais instituições de saúde começaram a perceber a importância de ter um ou mais psicólogos na equipe, uma vez que a compreensão de um ser humano biopsicossocial demanda a atenção de profissionais capacitados para intervir na psique desses sujeitos. Neste sentido, quem melhor do que os profissionais especializados em Psicologia da Saúde para desempenhar este trabalho?

Mas afinal, o que é a Psicologia da Saúde? Segundo um importante psicólogo norte-americano, ex-presidente da APA e presidente do primeiro departamento de Psicologia Médica do seu país de origem, a Psicologia da Saúde pode ser definida da seguinte maneira:

É o conjunto de contribuições educacionais, científicas e profissionais específicas da Psicologia, utilizadas para a promoção e manutenção da saúde, prevenção e tratamento das doenças, identificação da etiologia e diagnóstico (de problemas) relacionados à saúde, doença e disfunções, para a análise do sistema de atenção à saúde e formação de políticas de saúde.

(MATARAZZO, 1980, p. 815)

Diante disso, torna-se importante salientar que cabe à Psicologia da Saúde, o interesse frente ao adoecimento do sujeito e a promoção de saúde, isto é, como cada um experimenta seu estado de saúde e doença, dando espaço para suas relações pessoais e visões de mundo.

Existem duas leis brasileiras que falam um pouco sobre o conceito de saúde, são elas: Lei n° 8080 de 19/9/90, a Lei Orgânica da Saúde, e a Lei n° 8142 de 18/12/90. A primeira discorre sobre a promoção, proteção e recuperação da saúde e a segunda vai descrever a participação da comunidade na gestão do SUS.

O mais interessante dessas leis é que elas estabelecem um conceito que não se restringe apenas a tratar a saúde enquanto ausência de doença, mas pensam a saúde enquanto um conceito ampliado em que é preciso levar em conta alguns universos que fazem parte da vida de todo ser humano. Assim, temos o universo físico, já que todos nós temos um corpo e nos relacionamos de forma concreta no mundo. O universo socioeconômico, tendo em vista que todo ser humano nasce em uma família, frequenta instituições e se relaciona socialmente com outros vários seres humanos. Também não podemos perder a dimensão econômica em que esse indivíduo está inserido, pois o acesso a serviços de saúde pode ser diferente a depender de sua condição econômica. O universo cultural se constitui em um ponto importante na medida em que ter saúde também passa por uma concepção de um sujeito cultural.

As duas leis vão garantir o acesso à saúde como um direito de todo cidadão brasileiro, afirmando a responsabilidade do Estado em garantir esse direito. A Lei 8142/90 ainda vai enumerar os princípios do SUS que, dentre tantos, podemos destacar a acessibilidade do nosso sistema de saúde para todas as pessoas que procurem ajuda médica, a universidade do serviço e a humanização no tratamento das pessoas. Você pode conferir as outras atribuições do SUS na Lei 8142/90, que está disponível no site do Planalto Federal.

Cabe agora esclarecer as diferenças entre dois termos que podem parecer sinônimos, mas não são: atenção básica e atenção primária. A atenção básica se constitui em uma perspectiva mais ampla do que a atenção primária, pois trabalha com a promoção de saúde, a prevenção de doenças, o diagnóstico de enfermidades, o tratamento de patologias e até mesmo a reabilitação de pessoas que tenham passado por algum tipo de problema físico. A estratégia de saúde da família (ESF) – modelo que vem ganhando cada vez mais espaço como um substituto de um que preconizava a atenção individual, centrada na pessoa – trabalha na perspectiva da atenção básica. O termo atenção básica costuma ser usado no Brasil, enquanto o termo atenção primária é visto com mais frequência na literatura internacional. Atenção primária incorpora temas com relação à saúde coletiva, prevenção e promoção de saúde.

Agora que já entendemos a Psicologia da Saúde, passamos ao entendimento de suas formas de atuação. Vamos lá?

A PSICOLOGIA HOSPITALAR

Psicologia Hospitalar é o campo de entendimento e tratamento dos aspectos psicológicos em torno do adoecimento.

(SIMONETTI, 2004, p. 15)

Em sua prática diária, é atribuição do psicólogo hospitalar: “Atender a pacientes, familiares e/ou responsáveis pelo paciente; membros da comunidade dentro de sua área de atuação; membros da equipe multiprofissional e eventualmente administrativa, visando o bem-estar físico e emocional do paciente; e, alunos e pesquisadores, quando estes estejam atuando em pesquisa e assistência” (CFP, 2001, p. 13).

Atenção

A Psicologia Hospitalar não trata apenas das doenças com causas psíquicas, mas sim dos aspectos psicológicos de toda e qualquer doença. Desta forma, toda doença apresenta aspectos psicológicos; toda doença encontra-se repleta de subjetividade, e por isso, pode-se beneficiar do trabalho da Psicologia Hospitalar. Cada doença é entendida de uma determinada forma, conforme o sujeito está adoecido.

Vamos pensar juntos em exemplos para compreender como uma mesma doença pode reverberar de forma diferente conforme o sujeito que a experimenta?

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ESTUDO DE CASO 1

Imagine um homem chamado Carlos André, com 52 anos, casado há 32 com sua esposa, pai de dois filhos e em plena ascensão em sua carreira como chefe da unidade de trauma de um hospital, referência neste tipo de atendimento em sua cidade. Nos últimos dois dias, Carlos começa a sentir febre com constância, dores de garganta e nota o aparecimento recente de feridas pelo corpo. Apropriando-se de sua formação e conhecimento em Medicina, opta por tomar alguns analgésicos para aliviar os sintomas, porém os mesmos incômodos continuam após se encerrar o “efeito” das medicações administradas. Depois de muita postergação, ele resolve trocar sobre seus sintomas recentes com um colega médico que indica, aquilo que já deveria ter feito, uma bateria de exames para investigar o caso. Após duas semanas, ele volta a conversar com o colega médico, no entanto, desta vez, no lugar de paciente, pois Carlos André acabou de descobrir que é portador do vírus da imunodeficiência humana (HIV). Como médico, Carlos sabe que o vírus é uma condição crônica, sem cura e que exige muitos cuidados, mas que, com os avanços tecnológicos da indústria farmacêutica, é possível conviver relativamente bem com o vírus, desde que tenha boa adesão ao tratamento. Apesar dessas informações e seu conhecimento técnico, no lugar de paciente, ele continua apavorado com a descoberta. Ele sabe que o HIV é uma doença grave, mas que não é sinônimo de morte no século XXI. No entanto, dado o diagnóstico, permanece temeroso e ansioso com outras questões, dentre elas:

1°) Em um primeiro momento, os possíveis impactos que essa situação pode causar em seu trabalho. A ampliação da unidade que ele esperava para o início do próximo ano pode não acontecer, a doença pode trazer um estigma para sua vida, pode fazer seu prestígio cair junto aos seus colegas.

2°) A doença que ele contraiu, provavelmente, ao que tudo indica, é fruto de algumas relações extraconjugais que Carlos André foi acumulando ao longo do tempo, das quais ele se relacionava sexualmente sem os devidos cuidados para não contrair ou contaminar outra pessoa com doenças sexualmente transmissíveis.

3°) Carlos imagina que dar essa notícia para sua esposa e família, necessariamente, lhe obrigará a contar a verdade sobre suas relações extraconjugais. Como resultado disso, ele teme a possibilidade de sua esposa lhe pedir o divórcio e, consequentemente, perder o convívio diário com seus filhos.

ESTUDO DE CASO 2

Agora, vamos imaginar que um jovem de 27 anos, chamado Henrique, solteiro, sem filhos, que reside com seus pais enfermeiros, começa a apresentar os mesmos sintomas de Carlos André, sendo também diagnosticado com HIV. Inicialmente, Pedro recebe a notícia como uma condenação à morte e fica ansioso por conta desse diagnóstico, mas, depois do impacto inicial e de muitas conversas com seus pais, que lhe apoiaram e ofereceram todo o suporte que precisava, começa a perceber que a doença, ainda que grave e demandadora de muitos cuidados, tem controle e que é possível conviver com ela de forma satisfatória, sem perder a qualidade em sua vida. Henrique compreende que as consequências para seu comportamento sexual descuidado (uma vez, saindo de uma balada, momento que ele não usou preservativos para se prevenir do HIV) foram graves, porém o mundo não acabou e ele pode viver com o vírus, desde que tome os devidos cuidados. Sua ansiedade começa a desaparecer conforme percebe o apoio que tem da família, amigos e dos resultados do tratamento médico; esta rede de apoio tem feito toda a diferença.

É possível perceber que o mesmo processo, neste caso, o HIV, carrega significados diferentes para Carlos André e para Henrique? A doença é grave, a ansiedade e os medos que acompanham o diagnóstico acometem aos dois, mas Henrique encontra apoio da família e dos amigos, consegue absorver melhor o impacto da notícia e ter uma qualidade de vida resguardada. Carlos André experimenta a ansiedade de forma mais elevada e por maior tempo, imagina como o diagnóstico pode interferir em diversas áreas de sua vida, a quem ele irá recorrer para conseguir suporte e apoio emocional nesse momento? Mesmo acontecimento, vários sentidos que irão repercutir no estado de saúde.

A partir das definições supracitadas, cabe aqui a distinção entre Psicologia da Saúde, Psicologia Hospitalar e Psicologia Clínica, pois, ao mesmo tempo que se torna possível encontrar diferenças, também se faz necessário associar suas semelhanças no que tange às formas de atuação na prática nos especialistas nestas áreas:

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Psicologia Clínica

Atua nos três níveis de atenção: primário, secundário e terciário, no sentido de promover a saúde mental para os usuários destes serviços.

Psicologia da Saúde

Atua nos três níveis de atenção: primário, secundário e terciário, mas sua atuação está mais voltada para o universo sanitário, com especial atenção para os desdobramentos psicológicos de uma doença ou impossibilidade física que comprometa a saúde do sujeito.

Psicologia Hospitalar

É uma área que está dentro da Psicologia da Saúde, todavia, sua atuação está limitada ao hospital, enquanto local de trabalho do profissional. Está associada ao nível secundário e terciário.

A doença não é uma variação da dimensão da saúde; ela é uma nova dimensão da vida.

(CANGUILHEM, 2009, p. 73)

O entendimento do “ser doente” percebido por muitos dos profissionais da saúde, centrado apenas em questões anatomofisiológicas, não leva em consideração as subjetividades do sujeito. Sendo assim, a tendência é a redução de funcionalidades, dando prioridade aos aspectos e manifestações da doença e não ao sujeito adoecido.

Durante muito tempo, a saúde humana foi tratada separando mente e corpo. A importância do profissional de saúde em superar esta dualidade e compreender a pessoa em sua integralidade é fundamental já que a divisão mente-corpo somente tem função didática, mas, na prática, pouco auxilia na compreensão da saúde e do adoecimento humanos.

Psicologia Hospitalar

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Conclusão

Considerações Finais

Neste tema, iniciamos falando sobre o dualismo - concepção de que mente e corpo constituem substâncias distintas - e sobre o monismo - abordagem que considera mente e corpo parte da mesma substância.

Posteriormente, estudamos o conceito de psicossomática e somatopsíquica. A primeira diz respeito à relação entre mente e corpo e à produção de doenças advindas de desordens psíquicas. Já a segunda trata dos aspectos psicológicos gerados por uma lesão física ou doença. Além disso, analisamos como a Psicossomática assume uma posição mais conectada com o monismo do que com o dualismo.

Também compreendemos características da Psicologia da saúde, da Psicologia Hospitalar e questões relativas à multidisciplinaridade, interdisciplinaridade e transdisciplinaridade. Todos esses temas são atravessados pelos estudos da psicossomática.

Esta conclusão não se trata de um final ou algum tipo de fechamento, pois há muito mais a ser estudado, e o que aprendemos durante nossa leitura são aspectos introdutórios aos temas abordados.

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