Flor tubular, em forma de tubo.
Descrição
Definição dos conceitos básicos da Sistemática Filogenética, interpretação de cladogramas e construção de matrizes de caracteres e cladogramas.
PROPÓSITO
Conhecer os conceitos básicos da Sistemática Filogenética, para a compreensão da construção das árvores evolutivas e a interpretação do relacionamento entre os organismos a partir delas, em um contexto evolutivo.
OBJETIVOS
Módulo 1
Definir os conceitos básicos da Sistemática Filogenética
Módulo 2
Interpretar cladogramas
Módulo 3
Reconhecer a Sistemática Filogenética no Brasil
Introdução
A Sistemática Filogenética tem por objetivo classificar os seres vivos de acordo com a relação de parentesco entre eles, ou seja, reconstruir a história evolutiva ou genealógica dos seres vivos com base na ideia de ancestralidade comum.
Esse sistema de classificação foi proposto por Willi Hennig por volta da década de 1950. Hennig revolucionou a ciência por propor um método objetivo e testável, capaz de representar graficamente ― por meio de diagramas ramificados ou cladogramas ― o relacionamento entre as espécies. Até então, os seres vivos eram classificados de acordo com o grau de similaridade que apresentavam, sem refletir proximidade de parentesco ou ancestralidade comum.
Todos nós, seres vivos ― bactérias, fungos, plantas, mamíferos ―, descendemos de um ancestral comum. A Sistemática Filogenética nos permite reconstruir a história de descendência ou a história evolutiva dos táxons, dos mais basais até os mais derivados. Por meio da Sistemática Filogenética, entendemos não só como os táxons evoluíram ao longo do tempo, mas suas estruturas, suas características, incluindo as morfológicas, as anatômicas e as moleculares (DNA).
Táxons
A taxonomia é o ramo da ciência que visa descrever e classificar os seres vivos, organizá-los em reinos, filos, classes, ordens, famílias, gêneros e espécies. Um táxon é uma unidade taxonômica, o objeto de estudo da taxonomia, um táxon pode ser uma espécie, gênero ou uma família, por exemplo.
MÓDULO 1
Definir os conceitos básicos da Sistemática Filogenética
Os conceitos de plesiomorfia, simplesiomorfia, apomorfia e sinapomorfia
A Sistemática Filogenética propõe uma classificação que reflete a história evolutiva, ou genealogia, dos seres vivos. Isso é feito com base nas características, ou conjunto de características, exclusivas de cada táxon ou compartilhadas entre diferentes táxons. Em outras palavras, estudar a história evolutiva dos seres vivos é também estudar como as estruturas evoluíram e se modificaram nos diferentes táxons.
E como isso é feito?
Segundo a Sistemática Filogenética, podemos reconstruir o relacionamento evolutivo dos seres vivos ― o relacionamento filogenético ― a partir do estudo dos caracteres e seus estados. Então, se estamos estudando a evolução de plantas, por exemplo, para o caráter forma da flor, temos os estados de caráter tubular, campanulada e urceolada:
Atenção
É muito importante lembrar que, ao selecionarmos os caracteres para reconstruir a história evolutiva de qualquer grupo de seres vivos, temos que nos certificar de que esses caracteres estão presentes em estruturas homólogas, ou seja, estruturas com a mesma origem que apresentam ancestralidade comum. Seria impossível comparar asas de aves e asas de insetos, por exemplo, uma vez que as asas membranosas dos insetos e as asas de penas e sustentadas pelos ossos dos membros anteriores das aves têm origens diferentes, apesar de terem a mesma função.
Aprenderemos melhor sobre homologias a seguir, ainda neste conteúdo.
Agora, voltaremos ao exemplo das flores que citamos anteriormente. Depois de estabelecermos o caráter e os seus estados, precisamos desenvolver uma hipótese da sequência na qual as modificações ocorrem, ou da série de transformações destes caracteres.
Em relação ao caráter forma da flor, que estados seriam mais antigos e que estados seriam mais recentes ou derivados? Seria a forma tubular mais ancestral ou mais derivada nas flores? Como eram as primeiras flores?
Essas questões podem ser respondidas com a Sistemática Filogenética. Inclusive, hoje já sabemos algumas características da flor ancestral das angiospermas, as primeiras flores a surgir na Terra (SAUQUET et al. 2017).
Você sabia
Cientistas reconstruíram a flor ancestral das angiospermas, a primeira flor a surgir na Terra. Provavelmente era uma flor bissexual com simetria radial e ao menos 10 sépalas, 6 estames e 5 carpelos dispostos em espiral. No entanto, repare na figura que as cores, as formas e o tamanho relativo dos órgãos da flor ancestral foram criações artísticas dos autores, e não estimados no estudo.
Com base na série de transformações dos caracteres, ou seja, na sequência de modificações por que passam as estruturas ao longo da evolução dos seres vivos, classificamos como:
Plesiomorfia
(do grego, plesio = próximo a; morfia = forma), a condição mais antiga, original ou preexistente.
Apomorfia
(do grego, apo = longe de), a condição modificada ou mais derivada, mais recente.
Exemplo
A locomoção por dois pés, ou bipedia, em humanos é uma condição derivada (apomorfia) em relação à locomoção por quatro pés, mais antiga e original dos vertebrados tetrápodes.
A EVOLUÇÃO DO HOMEM REVELADA PELA SISTEMÁTICA FILOGENÉTICA
Neste vídeo, vamos entender mais da nossa história evolutiva, a história evolutiva dos seres humanos.
Ainda, é definido como:
Simplesiomorfia
(do grego, sim = juntamente), o compartilhamento de plesiomorfias, quando condições mais antigas ou plesiomórficas são compartilhadas por diferentes táxons.
Sinapomorfia
o compartilhamento de apomorfias, ou seja, quando condições mais derivadas ou apomórficas são compartilhadas por diferentes táxons. Por exemplo, são sinapomorfias dos mamíferos a presença de glândulas mamárias e de pelos, todos os mamíferos compartilham essas características derivadas.
Para identificarmos a condição mais antiga e a mais recente, ou seja, a condição ancestral e a mais derivada de determinado caráter, e assim propor a direção da mudança dentro de uma série de transformação, podemos utilizar algumas fontes de evidência.
Exemplo
Um exemplo de fonte de evidência é o estudo do desenvolvimento embrionário dos seres vivos ― estudo ontogenético —, que estabelece como estado mais antigo aquele apresentado nas fases iniciais do desenvolvimento do ser vivo, e como estados mais derivados aqueles apresentados nos estágios finais do desenvolvimento. Outro exemplo é o uso de grupos externos, ideia que foi um grande avanço da Sistemática Filogenética e propõe que, para determinar que condição é mais antiga ou mais recente, deve-se amostrar o conjunto de espécies mais externo ao seu grupo foco, e compará-los.
O grupo externo deve apresentar a condição mais antiga ou plesiomórfica, enquanto, por outro lado, a condição mais derivada ou apomórfica deve ter surgido necessariamente no grupo foco (também chamado de grupo interno). Então, com base no exposto, para estudarmos as relações de parentesco entre as espécies por meio das filogenias, é preciso delimitar o seu grupo foco, que deve ser monofilético, e um grupo mais abrangente que inclui o grupo externo, que também deve ser monofilético. Um grupo monofilético é formado por uma espécie ancestral e todas as suas espécies descendentes.
Aprenderemos mais sobre grupos monofiléticos nos módulos a seguir.
Atenção
Também é importante explicar que a condição apomórfica ou plesiomórfica de um caráter é relativa, ou seja, depende do nível taxonômico que estamos analisando. Um mesmo caráter pode ser apomórfico ou plesiomórfico, a menos que seja uma autapomorfia (do grego, auto = de si mesmo).
Uma autapomorfia é uma apomorfia de um táxon terminal, uma condição derivada exclusiva daquele táxon. Para que você entenda melhor os conceitos mencionados aqui, veja o exemplo ilustrado:
Os agrupamentos: monofiletismo, merofiletismo (polifiletismo e parafiletismo) e grupo irmão
A Sistemática Filogenética busca reconstruir a relação de parentesco entre os seres vivos. Um fator essencial desse sistema de classificação é o reconhecimento de grupos naturais, ou grupos monofiléticos. Os grupos não naturais, ou grupos merofiléticos, são considerados artificiais e podem ser classificados em polifiléticos ou parafiléticos.
Veremos a explicação e exemplos de cada caso a seguir.
Monofiletismo
É central para a Sistemática Filogenética. Um grupo monofilético é aquele formado por uma espécie (ou táxon) ancestral e todas as suas espécies (ou táxons) descendentes, sejam elas recentes ou fósseis. Em outras palavras, formam um grupo natural e monofilético: o ancestral comum e exclusivo + todos os seus descendentes.
Exemplo
O grupo dos anfíbios, ou classe Amphibia, é monofilético e inclui todos os anfíbios e seu ancestral comum exclusivo.
Exemplo
Aí está a ideia central da Sistemática Filogenética, distinguir os caracteres em apomorfias ou plesiomorfias (ou, quando compartilhadas por conjuntos de espécies, sinapomorfias e simplesiomorfias) e, por meio das apomorfias compartilhadas, delimitar grupos monofiléticos.
Merofiletismo
Descreve os grupos não naturais ou artificiais. Grupos merofiléticos são divididos em polifiléticos e parafiléticos, veja a explicação e a ilustração a seguir.
Grupo polifilético – é aquele formado por espécies (ou táxons) que não descendem de um ancestral comum e exclusivo delas. Um grupo polifilético é definido por homoplasias, ou seja, quando um caráter evolui para sua condição mais derivada ou se modifica para sua condição mais derivada mais de uma vez independentemente. Entenderemos melhor o conceito de homoplasia no próximo módulo.
Grupo parafilético – é aquele formado por uma espécie (ou táxon) ancestral, mas nem todas as suas espécies (ou táxons) descendentes. Ou seja, por não incluírem todas as suas espécies (ou táxons) descendentes, apresentam um ancestral comum, mas não exclusivo. Um grupo parafilético é definido por simplesiomorfias.
Exemplo
O grupo dos peixes é considerado um grupo parafilético, e não natural, pois não possui um ancestral comum e exclusivo. Antigamente, os seres vivos eram classificados com base nas suas semelhanças, sem levar em conta o relacionamento evolutivo ou filogenético das espécies. Hoje, com o avanço da Sistemática Filogenética, a história evolutiva de diversos grupos de seres vivos vem sendo acessada, e sabemos que os peixes não existem como grupo natural.
Os peixes cartilaginosos, os peixes com nadadeiras raiadas, os celacantos e os peixes pulmonados não apresentam um ancestral único e exclusivo, mas sim um ancestral compartilhado com os anfíbios, os répteis e os mamíferos, incluindo nós humanos. Sendo assim, o grupo dos vertebrados é o grupo monofilético que inclui o ancestral comum e exclusivo de todos os peixes, e também todos os anfíbios, répteis e mamíferos, como mostrado na ilustração a seguir:
Por fim, é importante definir o termo grupo irmão, bastante utilizado em Sistemática Filogenética. São grupos que compartilham um ancestral em comum mais recente.
Dentro do grupo dos vertebrados, por exemplo, os mamíferos são grupo irmão dos répteis. Veja o esquema a seguir.
Os conceitos de homologia, analogia, homoplasia (reversão, paralelismo e convergência)
As similaridades entre seres vivos diferentes podem ocorrer devido a uma história evolutiva compartilhada entre eles, mas também podem ter tido uma origem totalmente independente no curso da evolução.
A Sistemática Filogenética está interessada no primeiro caso: nas similares entre seres vivos diferentes, que refletem a sua história evolutiva compartilhada, que podem ter sido herdadas de ancestrais recentes em comum.
Entenda agora os conceitos de homologia, analogia e homoplasia, que definem melhor essa ideia.
Homologia
É um conceito fundamental da Sistemática Filogenética que permite a comparação das partes similares de seres vivos diferentes. Se dizemos que estruturas de organismos diferentes são homólogas, significa que esses organismos têm um ancestral comum mais recente que também possuía essa estrutura. Por exemplo, os membros anteriores dos humanos e dos felinos, as nadadeiras das baleias e as asas dos morcegos são homólogos (imagem 1).
Para reconstruirmos as relações filogenéticas, ou seja, a história evolutiva dos seres vivos, devemos utilizar suas partes homólogas, porque elas refletem a ancestralidade comum.
E como identificar homologias?
Ao compararmos organismos diferentes, devemos atentar para as estruturas que possuem partes integrantes e formas semelhantes, assim como as que apresentam posição relativa semelhante. Ainda, é importante considerar o desenvolvimento embrionário dos organismos, pois estruturas homólogas são formadas a partir das mesmas células, seguindo uma mesma sequência de modificação e comumente ocupando a mesma posição.
Analogia
Representa a ideia de mesma função, no entanto, com origens diferentes. Quando seres vivos apresentam estruturas análogas, significa que essas estruturas desempenham funções similares, porém não têm a mesma origem, ou seja, não refletem uma ancestralidade recente comum. Temos um exemplo de analogia nas asas membranosas dos insetos e nas asas de penas sustentadas pelos ossos dos membros anteriores das aves. Esses grupos possuem histórias evolutivas mais distantes entre si, suas asas têm a mesma função, no entanto, têm origens independentes (imagens 2 e 3).
Homoplasia
Uma das grandes dificuldades das reconstruções filogenéticas é lidar com a homoplasia. Ela ocorre quando uma apomorfia (característica derivada) surge mais de uma vez, de forma independente, em seres vivos diferentes. Em outras palavras, quando as mesmas características derivadas surgem independentemente em dois ou mais grupos.
As homoplasias impõem um desafio para a reconstrução da história evolutiva dos grupos com base na ideia de ancestralidade comum e exclusiva. Isso porque origens múltiplas e independentes de uma determinada característica (homoplasia) podem ser, de forma equivocada, interpretadas como uma origem única e compartilhada (apomorfia ou sinapomorfia), resultando no agrupamento de grupos não diretamente relacionados, como se compartilhassem de um ancestral recente, comum e exclusivo. As homoplasias podem ocorrer de diferentes formas: por reversão, paralelismo ou convergência.
As características derivadas apresentam uma similaridade superficial, referente à função, enquanto são estruturalmente diferentes e possuem histórias evolutivas independentes. Como exemplo de convergência, podemos pensar no caso já mencionado das analogias entre as asas de insetos e das aves. As nadadeiras dos peixes e das baleias são outro exemplo, pois possuem a mesma função, entretanto, têm origens independentes.
As características derivadas são mais similares em termos de desenvolvimento e surgem independentemente em grupos diferentes, no entanto, tais grupos têm maior proximidade evolutiva, são mais similares geneticamente e compartilham estruturas ainda bastante parecidas. Por exemplo, a via fotossintética C4 em gramíneas é um exemplo de paralelismo. Os genes que codificam a principal proteína dessa via C4 evoluíram pelo menos oito vezes, de forma independente, nas gramíneas, como mostram os cientistas (CHRISTIN et al. 2007).
Ocorre de uma característica derivada voltar a ser similar à sua condição ancestral. Por exemplo, dois grupos apresentam características derivadas similares, porém, em um dos grupos, tal característica se assimila à condição ancestral (devido a uma reversão). Um estudo mostrou a reversão dos membros de lagartos (KOHLSDORF; WAGNER, 2006). Ao longo da evolução, alguns lagartos perderam seus dedos, os membros foram encurtando ou desapareceram. Contudo, uma parte conseguiu reverter a perda de membros.
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MÓDULO 2
Interpretar cladogramas
O que é um cladograma e o princípio da parcimônia
A história evolutiva ou genealógica dos seres vivos pode ser representada graficamente por diagramas ramificados (dendogramas) que conectam esses seres vivos e refletem a relação de ancestralidade e parentesco entre eles. Também podemos chamar esses dendogramas de diagramas filogenéticos ou, de modo genérico, de filogenias, ou ainda de cladogramas.
Um cladograma é, por definição, um dendograma que mostra as relações filogenéticas entre os táxons terminais, sendo que as conexões entre eles evidenciam uma história evolutiva comum.
Cladogramas são uma aproximação ou estimativa da história evolutiva real dos seres vivos, recentes ou extintos e assim devem ser considerados: uma hipótese de história evolutiva, pois são construídos com base nas limitadas informações que existem hoje.
Apesar de os cientistas acessarem cada vez mais dados ― ontogenéticos, anatômicos, morfológicos, moleculares ― de um número cada vez maior de espécies, incluindo fósseis, eles ainda trabalham com uma pequena parte da informação, uma pequena parte das evidências da história evolutiva da vida, que se originou no planeta há bilhões de anos.
Atenção
Ainda, é importante frisar que a descoberta de novas espécies e a inclusão de novos caracteres podem tanto corroborar quanto alterar o cladograma (ou a hipótese filogenética) de um grupo de seres vivos, trazendo novas perspectivas e mais luz à história da evolução da vida na Terra.
Se pensarmos o quão intrincada é a história dos seres vivos, na enorme riqueza de espécies existentes e na diversidade de estruturas e caracteres que as espécies apresentam, então podemos imaginar que não é fácil reconstruir suas relações de parentesco e ancestralidade.
Exemplo
Se construíssemos um cladograma para um grupo hipotético com 4 táxons terminais (A, B, C e D), haveria 15 cladogramas possíveis, isso se considerarmos apenas os cladogramas dicotômicos e deixarmos de fora os cladogramas que apresentam politomias (cladogramas em que um ancestral comum dá origem a mais de dois descendentes). Veja o exemplo de politomia riscado em vermelho na figura.
Cada um dos quinze cladogramas da figura conta uma história de parentesco diferente entre os táxons terminais (A, B, C e D). Se incluíssemos mais táxons, o número de cladogramas possíveis aumentaria muito. Além disso, os cladogramas são construídos com base nos caracteres apresentados pelos táxons terminais (que devem ser estruturas homólogas ou atributos de estruturas homólogas, portanto comparáveis entre os táxons) e nos estados desses caracteres (que refletem plesiomorfias, estados ancestrais dos caracteres, ou apomorfias, estados derivados dos caracteres).
Para escolher que hipótese de relacionamento ou que cladograma considerar verdadeiro, os cientistas podem utilizar o princípio da parcimônia.
O princípio da parcimônia é bem difundido em diversas áreas da ciência e determina que quando há mais de uma explicação para determinada observação, devemos adotar a mais simples.
Seguindo o princípio da parcimônia, o cladograma com o menor número de passos evolutivos ou alterações nos estados dos caracteres ― o cladograma mais parcimonioso ― deve ser escolhido dentre os diversos possíveis cladogramas. Por exemplo:
Exemplo
Veja a figura e imagine que existam dois cladogramas possíveis para o relacionamento entre os táxons A, B, C e D, considerando um certo caráter hipotético representado em azul. Imagine que esse caráter seja o formato do bico, que pode ser reto (1) ou recurvado (1’).
- O cladograma da esquerda indica três passos evolutivos: uma mudança para bico reto, seguida de uma mudança para bico recurvado em B, e outra mudança, independente, para bico recurvado em D.
- O cladograma da direita indica dois passos evolutivos: uma mudança para bico reto, seguida de uma mudança para bico recurvado em B + D.
O cladograma da direita é mais parcimonioso, pois tem menos passos evolutivos.
Interpretação de um cladograma
Vamos entender melhor como interpretar um cladograma ― dendograma que conecta os seres vivos indicando a história evolutiva comum entre eles ― começando pela caracterização de suas partes (imagem 4).
Representam as unidades de estudo. Um terminal pode ser representado por um indivíduo, uma população, uma espécie, um gênero ou uma família. Por exemplo, um cladograma mostrando o relacionamento entre as populações da espécie Orcinus orca (a baleia orca) no qual cada terminal vai representar uma população diferente; ou um cladograma dos hominídeos, no qual cada terminal representa diferentes espécies como Homo sapiens, Homo neanderthalensis e Homo heidelbergensis. Ou, ainda, um cladograma das plantas com flores no qual cada táxon terminal representa uma família botânica, como Orchidaceae, Bromeliaceae e Poaceae. Na figura 4, os terminais são representados pelas letras A, B, C, D, E e F.
São as linhas que conectam os terminais através dos nós.
São a junção entre dois ou mais ramos. Os nós representam ancestrais comuns hipotéticos e indicam a ocorrência de eventos de cladogênese, ou seja, de separação ou divergência entre os táxons. Na figura 4, os nós são representados pelos pontos pretos. O nó que liga A e B representa o ancestral comum mais recente de A e B, indicando que houve um evento de cladogênese que separou A e B em táxons diferentes. Da mesma forma, o nó entre D e E representa o ancestral comum mais recente de D e E, indicando que houve um evento de cladogênese que separou D e E em táxons diferentes.
Indica a posição do primeiro nó do cladograma. Esse primeiro nó representa o ancestral comum mais recente do grupo todo A + B + C + D + E + F.
O cladograma mostrado na imagem 4 pode ser representado em forma de texto como segue: ((((A, B), C), (D, E)), F). Veja, com isso, que é possível representar as relações entre os seres vivos e seus níveis hierárquicos utilizando a notação parentética. Ainda, todo agrupamento que inclui o ancestral comum e todos os seus descendentes pode ser chamado de clado.
Clado é uma terminologia comum e muito utilizada em estudos filogenéticos, pois é uma forma genérica de se referir a tais agrupamentos.
Os cladogramas podem variar em relação à sua formatação, apresentando diferentes aspectos. Veja o exemplo da imagem 5. Apesar da variação, o mesmo relacionamento entre os táxons é mostrado: A e B possuem um ancestral comum mais recente (A é irmão de B e vice-versa), assim como A + B é grupo irmão de C. Perceba que os nós podem ser girados, como exemplificado nas setas em azul, sem afetar o relacionamento dos táxons terminais.
Exemplo
E os caracteres que são utilizados para reconstruir a história evolutiva dos táxons, como são representados nos cladogramas?
Na figura a seguir, apresentamos as mudanças relacionadas a um caráter hipotético (em azul). Por exemplo, vamos imaginar que esse caráter seja a cor das flores, e os seus estados sejam: branca (1) e lilás (1’). Interpretando os estados de caracteres com base nos conhecimentos que adquirimos nos módulos anteriores deste conteúdo, podemos relembrar os conceitos de plesiomorfia e apomorfia.
Exemplo
O estado 1 (flores brancas) seria uma plesiomorfia (do grego plesio = próximo a), ou seja, um estado ancestral do caráter, que está próximo ao ancestral. Já o estado 1’ (flores lilases) seria uma apomorfia do táxon B (do grego apo = distante, longe de), ou seja, um estado derivado desse caráter, mais distante do ancestral.
Geralmente, num cladograma resolvido, os ramos sofrem bifurcações (dicotomias), um ancestral comum dá origem a dois descendentes. Contudo, quando algumas das relações entre os táxons não são resolvidas em dicotomias, ou seja, quando um ancestral comum dá origem a mais de dois descendentes, surgem as politomias (ramos trifurcados ou mais, conforme imagem 6).
Politomias podem indicar a falta de caracteres distintivos, isto é, dados insuficientes para discriminar os táxons ou até mesmo dados conflitantes. Politomias também podem indicar uma possível radiação adaptativa — eventos especiação múltiplos ocorrendo quase simultaneamente.
Construção de matrizes de caracteres e cladogramas
Cladogramas representam uma hipótese sobre as relações de parentesco entre os seres vivos e são inferidos com base nas suas características, sejam elas morfológicas, genéticas ou outras.
Atenção
É importante frisar que as características de dada espécie são o resultado da herança, com ou sem modificações, de características homólogas que existiam em seus ancestrais, e nos ancestrais de seus ancestrais, e assim sucessivamente até o primeiro ser vivo da Terra, porque toda a diversidade de seres vivos da Terra surgiu de um único ancestral.
Buscar a homologia, ou seja, estruturas homólogas, e definir os caracteres e os estados destes é um passo crucial no estudo filogenético de um grupo. Os caracteres utilizados para a construção de cladogramas podem ser qualitativos — referentes a uma qualidade, como cor, formato ou tipo de ornamentação de determinada estrutura — ou quantitativos — referentes à quantidade, como o número de pétalas, número de patas ou tamanho em centímetros de determinada estrutura.
Os caracteres também podem estar ligados às sequências de DNA, por exemplo, em filogenias moleculares, em que os diferentes estados de caráter são representados pelas diferentes bases dos nucleotídeos (adenina, timina, citosina e guanina). Em relação ao número de estados, os caracteres podem ser binários (com dois estados: 0, 1) ou multiestados (com mais de dois estados: 0, 1, 2,...). Veja o exemplo de uma matriz de caracteres montada.
Táxons |
Caráter 1 forma da flor |
Caráter 2 cor da pétala |
Caráter 3 forma da folha |
Caráter 4 indumento da folha |
Caráter 5 forma do ápice da folha |
---|---|---|---|---|---|
A | 1 | 1 | 1 | 1 | 1 |
B | 1 | 1 | 1 | 1 | 0 |
C | 1 | 1 | 1 | 0 | 0 |
D | 1 | 1 | 0 | 0 | 0 |
E | 1 | 0 | 0 | 0 | 0 |
Gr. ext. | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 |
Elaborada por: Denise Neves.
Repare que as linhas da matriz representam os táxons e as colunas representam os diferentes caracteres. Os estados dos caracteres são:
forma da flor: (0) campanulada e (1) tubular.
cor da pétala: (0) branca e (1) lilás.
forma da folha: (0) palmada e (1) bilobada.
indumento da folha: (0) ausente e (1) presente.
forma do ápice da folha: (0) arredondado e (1) agudo.
Essa matriz, por exemplo, inclui somente caracteres morfológicos. Estudos filogenéticos, entretanto, podem ser realizados também com base em outros tipos de caracteres, como os caracteres moleculares (e.g. codificados a partir de sequências de DNA).
Vamos entender como uma matriz de caracteres é montada.
Grupo interno
Primeiro, é importante delimitar o grupo foco, o grupo de estudo ou grupo interno. Depois, precisamos escolher o nosso grupo externo. O grupo externo inclui um ou mais táxons que são similares aos táxons do grupo interno, portanto, são comparáveis aos táxons do grupo interno e podem servir de referência para determinar as relações de parentesco dentro do grupo interno. Por exemplo, seria impossível comparar elefantes e bactérias, pois eles são muito distantes evolutivamente e suas estruturas são muito distintas. Nesse exemplo, seria mais interessante comparar os elefantes a outro grupo de mamíferos.
Identificar os caracteres
O próximo passo é identificar os caracteres. Eles devem ser variáveis, isto é, apresentar variações ou diferentes estados, e, principalmente, devem ser selecionados com base em uma hipótese de homologia. Lembre-se de que partes homólogas são aquelas que têm ancestralidade comum, afigurando-se como evidências de parentesco entre os táxons. É interessante selecionar, então, partes comparáveis entre os táxons, partes similares que têm uma possível origem em comum, homólogas.
Codificar os caracteres
Após a escolha dos grupos interno e externo e dos caracteres, é necessário começar a codificar os caracteres. Repare na matriz da tabela anterior que o caráter 1 (forma da flor) é binário, pois apresenta dois estados (0) campanulada e (1) tubular. Todos os táxons do grupo interno (A, B, C, D, E) têm flor tubular, já o táxon do grupo externo (Gr. ext.) tem flor campanulada. O preenchimento da matriz é feito dessa forma, por meio da análise de cada táxon e de suas características. Repare que, à medida que a matriz é preenchida com os caracteres e seus estados nos táxons estudados, são reveladas as pistas de como tais caracteres evoluíram, quais eram os seus estados no grupo externo e se eles se modificaram ou não no grupo interno. Veja que os estados de caracteres mais antigos, presentes no grupo externo, podem indicar plesiomorfias (no nosso exemplo na tabela, foram codificados como 0). Já os estados de caracteres mais recentes ou derivados, presentes somente no grupo interno, podem indicar apomorfias (no nosso exemplo na tabela, foram codificados como 1).
Depois da matriz pronta, é possível construir então o cladograma. Utilizaremos os dados da matriz do exemplo anterior. Começaremos a construir o cladograma identificando onde estão as apomorfias ou os estados apomórficos de cada caráter (que no nosso exemplo foram codificados como 1), examinando um a um.
Veja o passo a passo simplificado. O estado apomórfico do caráter 5 (forma do ápice da folha) está presente apenas no táxon A. O estado apomórfico do caráter 4 (indumento da folha) reúne os táxons A e B. O estado apomórfico do caráter 3 (forma da folha) reúne os táxons A, B e C. O estado apomórfico do caráter 2 (cor da pétala) reúne os táxons A, B, C e D. Já o estado apomórfico do caráter 1 (forma da flor) reúne todos os táxons do grupo interno, A, B, C, D e E.
Repare que começamos a construir o cladograma a partir dos agrupamentos menores em direção aos maiores.
Até aqui, aprendemos os conceitos básicos em Sistemática Filogenética e aprendemos a interpretar os cladogramas, também conhecidos genericamente como filogenias, que são a representação gráfica das relações de parentesco entre os seres vivos. Os exemplos que utilizamos foram todos referentes aos seres vivos e à sua história evolutiva.
Entretanto, as análises filogenéticas têm diferentes aplicações, que incluem, por exemplo, o estudo da evolução da linguagem e de diversos outros traços culturais. Confira no vídeo a seguir.
AS DIFERENTES APLICAÇÕES DAS ANÁLISES FILOGENÉTICAS: DESDE O ESTUDO DA EVOLUÇÃO DOS SERES VIVOS À EVOLUÇÃO DA LINGUAGEM E OUTROS TRAÇOS CULTURAIS
Neste vídeo, conheça mais detalhes desses exemplos.
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MÓDULO 3
Reconhecer a Sistemática Filogenética no Brasil
Principais instituições de pesquisa em Sistemática Filogenética
A Sistemática Filogenética, partindo da contribuição de Willi Hennig, desenvolveu-se cada vez mais com a contribuição de inúmeros outros cientistas e com o desenvolvimento de novos métodos, fundamentos teóricos e ferramentas, principalmente as computacionais. Hoje existem inúmeros programas de computador, scripts e recursos de bioinformática que nos permitem inferir a evolução dos táxons e dos caracteres com mais robustez e confiabilidade, assim como construir árvores filogenéticas com base em dados cada vez mais volumosos e refinados.
Com a expansão do conhecimento e das técnicas em biologia molecular, principalmente em relação à amplificação e sequenciamento do DNA dos seres vivos, o perfil genético dos táxons foi cada vez mais acessado. Assim, as filogenias, que eram basicamente construídas com base em dados morfológicos, incorporaram os dados moleculares ou genéticos. A Sistemática Filogenética entrou na era molecular.
As filogenias moleculares, então, passaram a revelar interessantes informações sobre o relacionamento entre os táxons. Muitos grupos delimitados com base na morfologia, após terem seus relacionamentos filogenéticos testados, não tiveram monofiletismo comprovado e, por não serem monofiléticos, são hoje considerados grupos não naturais.
Importantes instituições de pesquisa em Sistemática Filogenética podem ser destacadas. A grande maioria integra as universidades, no Brasil e nos demais países.
Você sabia
São diversos os laboratórios com foco em Sistemática Filogenética, liderados por renomados cientistas, como Gareth Nelson na Melbourne University, Kevin Clark Nixon na Cornell University, Scott Edwards na Harvard University, Sudhir Kumar e Stephen Blair Hedges na Temple University e Alexandre Antonelli na University of Gothenburg.
As pesquisas de ponta desenvolvidas por esses líderes são focadas em grupos específicos ou, em alguns casos, são mais amplas. Seus estudos evolutivos têm foco nos táxons, nos caracteres em si ou em biomas inteiros. Eles investigam também os fatores geológicos, climáticos e ecológicos que afetam a evolução das espécies e dos caracteres. Produzem arcabouços teóricos, novos softwares, e desenvolvem pipelines e análises diversas para incorporar e combinar dados de diversas fontes, que servem como base para os estudos evolutivos.
Saiba mais
Há também consórcios e grupos de pesquisadores que desenvolvem projetos maiores em conjunto. Muitas dessas iniciativas envolvem uma compilação dos dados já publicados nos inúmeros trabalhos realizados de forma independente por alunos, pós-graduandos e professores em todo o mundo. Outras envolvem um esforço para a produção de novos dados, como genomas inteiros de espécies. Essas iniciativas buscam reconstruir a história evolutiva de grupos específicos, como faz o APG (Angiosperm Phylogeny Group) para as plantas com flor ou angiospermas, ou dos seres vivos como um todo, como os projetos Tree of life, The Timescale of Life e OneZoom.
Conheça mais sobre tais iniciativas no vídeo a seguir.
THE TREE OF LIFE – A ÁRVORE DA VIDA
Neste vídeo, vamos conhecer iniciativas para a reconstrução da Árvore da vida ― The Tree of life.
Pesquisadores sistematas brasileiros e a divulgação científica em Sistemática Filogenética
As pesquisas em Sistemática Filogenética no Brasil demoraram a deslanchar. O doutor em Zoologia, Paulo Emílio Vanzolini, foi pioneiro ao propor a classificação dos animais com base na sua história evolutiva. Vanzolini fez sua carreira do Museu de Zoologia da Universidade de São Paulo.
Mais tarde, Nelson Papavero, aluno de doutorado de Vanzolini, descobre o trabalho de Willi Hennig sobre Sistemática Filogenética e começa a estudá-lo. Nelson Papavero e Nelson Bernardi, ambos pesquisadores no Museu de Zoologia, passam então a disseminar as ideias sobre a Sistemática Filogenética para a comunidade acadêmica.
Logo, Nelson Bernardi cria o primeiro curso de Sistemática Filogenética. A partir daí, a Sistemática Filogenética começa a ser disseminada e ganhar popularidade no país, principalmente por volta das décadas de 1970 e 1980.
Dentre os importantes pesquisadores sistematas brasileiros, podemos citar outros tantos, como:
Ângelo Pires do Prado (Unicamp), o primeiro a usar, de fato, os métodos de Hennig no Brasil para propor uma hipótese de classificação para o grupo de táxons que estudava.
Dalton de Souza Amorim (USP), aluno de Nelson Papavero e autor do livro Fundamentos de Sistemática Filogenética.
Paulo Andreas Buckup e Alcimar do Lago Carvalho, ambos do Museu Nacional (UFRJ), zoólogos e professores de Sistemática Filogenética.
Carlos Guerra Schrago (UFRJ), referência no estudo de evolução molecular.
A divulgação científica é um dos aspectos da pesquisa científica que vem ganhando cada vez mais espaço atualmente. A difusão das ideias e dos resultados produzidos pelos cientistas é importante não somente no meio científico, entre os cientistas e seus pares, mas também para a sociedade em geral, principalmente para os jovens e as crianças.
Divulgar ciência é importante não só para informar o público em geral, mas para despertar interesse e consciência sobre diversos assuntos, inclusive os relacionados à conservação da biodiversidade e dos ambientes naturais.
Do ponto de vista dos cientistas, divulgar ciência é importante para que tenham sua pesquisa reconhecida e seu conhecimento difundido, além de permitir que façam o exercício de transformar o conhecimento mais técnico e complexo em um conteúdo de fácil entendimento para o público em geral.
Divulgar ciência é importante para que os jovens e crianças se sintam estimulados a perseguir a carreira científica. As universidades têm como tripé o ensino, a pesquisa e a extensão. Por extensão, entendemos a ação de devolver para a sociedade, de alguma forma, todo o conhecimento produzido nessas instituições por meio do ensino e da pesquisa.
A divulgação cientifica é uma das formas das universidades cumprirem esse papel.
Especificamente em relação à Sistemática Filogenética, a divulgação científica pode ajudar o público em geral no entendimento de que todos os seres vivos estão conectados e apresentam ancestralidade comum, e que é possível reconstruir as relações de parentesco ou relações filogenéticas entre os seres vivos utilizando as informações disponíveis hoje. Este ramo da Biologia ― a Sistemática Filogenética ― pode nos ajudar a entender outras tantas questões, tais como:
Quem são nossos parentes mais próximos; quem são os parentes mais próximos dos dinossauros que habitam atualmente a Terra; quais foram os primeiros organismos a habitar a Terra; como são definidos os grupos naturais de seres vivos; ou, ainda, quem se originou primeiro: o ovo ou a galinha.
Alguns projetos ligados à Universidade de São Paulo, como a Série Evolução Humana e a Série Evolução para Todes, divulgam ciência em forma de vídeos sobre a história da evolução da nossa espécie. O Museu Nacional, vinculado à Universidade Federal do Rio de Janeiro, divulga ciência ativamente por meio de suas coleções, que incluem dinossauros, pterossauros e preguiças gigantes (acervo que vem sendo reparado após incêndio recente na instituição), oficinas e cursos variados.
Saiba mais
Os artigos de popularização da ciência publicados em revistas de linguagem simples e amplo alcance são outra forma de divulgação. Por exemplo, a coluna “Caçadores de fósseis”, da Revista Ciência Hoje, escrita pelo pesquisador Alexandre Kellner, do Museu Nacional (UFRJ), que divulga, de forma bem didática, interessantes descobertas científicas (KELLNER, 2010).
Importância da Sistemática Filogenética para o estudo da biodiversidade no Brasil
No estudo da biodiversidade, é imprescindível conhecer e nomear as espécies. Esse é o primeiro passo, pois somente a partir daí é possível associar conhecimento a tais espécies ― em relação à morfologia, anatomia, fisiologia, genética, comportamento, distribuição geográfica, tipo de habitat, propriedades ecológicas, econômicas, medicinais etc. O problema é que não conhecemos toda a biodiversidade que habita a Terra, apenas uma pequena fração dela.
Ainda há muitas espécies a serem descobertas e descritas pela ciência e muitas áreas pouco ou nunca exploradas que podem revelar novas espécies, e também há muitos grupos taxonômicos que carecem de estudos por parte dos cientistas.
Atenção
Outro ponto importante a considerar é que algumas áreas do planeta apresentam maior riqueza de espécies e mais alta biodiversidade do que outros, e necessitam de maior esforço por parte dos pesquisadores para que tal riqueza seja estudada em sua totalidade. Esse é o caso do Brasil, um país megadiverso que conta com dois hotspots de diversidade: a Mata Atlântica e o Cerrado ― além da maior floresta tropical do mundo, a Amazônia.
Como um país de tamanho diversidade e em desenvolvimento, o Brasil encontra pela frente um desafio enorme para descobrir, nomear, estudar e, principalmente, preservar sua biodiversidade. Os altos índices de desmatamento e as inúmeras ameaças pelas quais nossa biodiversidade tem passado mostram o quanto estamos perdendo e ainda podemos perder de biodiversidade ― incluindo as espécies que nem conhecemos ainda.
Um recurso muito importante para o estudo da nossa biodiversidade são as coleções biológicas, que guardam material de coletas zoológicas, botânicas e microbiológicas. Esses materiais dão suporte aos cientistas e às pesquisas com os mais diferentes focos, além de representarem testemunhos de nossa riqueza de espécies e ambientes naturais. As coleções biológicas do país também carecem de investimento em infraestrutura, tecnologia e pessoal.
A Sistemática Filogenética propõe um sistema de classificação robusto da biodiversidade, com base nas relações de parentesco e ancestralidade entre as espécies. Classificações propostas com base em filogenias fornecem um arcabouço evolutivo importante, porque revelam muito mais do que semelhanças entre espécies, revelam histórias evolutivas em comum.
Estudar a biodiversidade, o conjunto de espécies por uma perspectiva evolutiva ― para além de investigar as espécies isoladamente, fora de seu contexto evolutivo ― traz informações adicionais importantes.
Por exemplo:
Exemplo
Cientistas utilizaram filogenias para prever a quantidade e a qualidade de compostos químicos em espécies de Cinchona. As espécies de Cinchona, nativas dos Andes, ficaram muito conhecidas por seu composto químico chamado quinina, encontrado na casca dos seus troncos e usado por mais de 400 anos para tratar a malária, salvando muitas vidas. A partir das filogenias, foi possível reconhecer que certos clados (grupos) apresentavam grande concentração desses alcaloides, enquanto outros apresentavam baixas concentrações e diferente composição daqueles (MALDONADO et al., 2017). Nesse caso, as filogenias revelaram quem são as plantas com alto potencial para a busca dos tais alcaloides com propriedade medicinal.
Filogenias também podem ajudar a subsidiar estratégias e prioridades de conservação de áreas naturais. Por exemplo:
Exemplo
Áreas com maior diversidade filogenética (com táxons filogeneticamente mais distintos entre si, ou seja, com táxons que apresentam relações de parentesco mais distantes entre si) devem ter prioridade, em detrimento de áreas com menor diversidade filogenética (com táxons filogeneticamente mais próximos entre si, ou seja, com relações de parentesco mais próximas).
Resumindo
De forma geral, resumindo o que foi explicado, as filogenias nos possibilitam inferir a evolução não só dos táxons em si, mas de seus caracteres, mesmo aqueles não incluídos nas análises. Pesquisadores de qualquer área da Biologia que decidam estudar os táxons para os quais já existem filogenias construídas, partem de um ponto de vantagem, pois podem prever a presença ou ausência de certas características com base nas relações de parentesco e ancestralidade comum desses táxons.
A Filogenia possui, então, diversas aplicações, podendo contribuir com pesquisas em compostos naturais, conservação e diversas outras frentes.
Verificando o aprendizado
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Conclusão
Considerações Finais
Definimos a Sistemática Filogenética e conhecemos seus conceitos básicos. Entendemos a importância de reconhecer grupos monofiléticos, grupos naturais, assim como as apomorfias ou sinapomorfias que os definem. Caracterizamos as homologias, partes iguais ou similares de táxons diferentes que apresentam ancestralidade comum.
Conhecemos os cladogramas, diagramas ramificados que representam as relações de parentesco entre os táxons. Aprendemos como interpretar os cladogramas e conhecemos suas partes integrantes. Aprendemos também a construir matrizes de caracteres e cladogramas, empregando na prática os conceitos básicos em Sistemática Filogenética. Além disso, conhecemos o princípio da parcimônia, segundo o qual a explicação mais simples sobre um fenômeno natural deve ser a escolhida dentre todas as possíveis.
Por fim, conhecemos importantes instituições de pesquisa e pesquisadores em Sistemática Filogenética, no Brasil e no mundo. Acompanhamos, ao longo do tempo, como esse ramo das Ciências Biológicas se desenvolveu no Brasil. Também aprendemos sobre a importância da divulgação cientifica de forma geral e reconhecemos o importante papel da Sistemática Filogenética para o estudo da biodiversidade brasileira.
Podcast
Agora, a especialista Beatriz Neves encerra este estudo falando sobre como a Sistemática Filogenética mudou a nossa maneira de enxergar a evolução dos seres vivos.
CONQUISTAS
Você atingiu os seguintes objetivos:
Definiu os conceitos básicos da Sistemática Filogenética
Interpretou cladogramas
Reconheceu a Sistemática Filogenética no Brasil